Hoje senti medo. Creio
que foi a primeira vez que me aconteceu sentir medo na escola, mas hoje
senti-o. E não gostei.
Depois de quase ter sido
vilmente atropelada pela colega E.C. que há muito anseia pelo meu fim, coisa
que não me incomodou, encontrei a colega T.B. e, juntas, transpusemos o portão.
Descontraidamente, com a elegância que nos é habitual e que, momentaneamente,
quis parecer-me, silenciou o recinto do burburinho do intervalo, ouvindo-se
apenas um “ah” de puro êxtase, lá nos dirigíamos para a entrada do
bloco.
-QUEM É QUE FOI
DIZER À PRESSORA QUE EU TINHA ESTADO NO CONTINENTE SE EU NÃO
ESTIVE LÁ?!?
O caro leitor que me
perdoe a gritaria, limito-me a reproduzir o que a E.D. dizia, enquanto se me dirigia de mãozinha apoiada no quadril.
Quando me apercebi que era comigo, embora não quisesse demonstrar o temor que
me tomou, tanto, que até me escondi ligeiramente atrás da colega T.B.,
respondi-lhe aquilo que nem merecia ser referido, de tão óbvio que é:
- Eu sei tudo, E.! –
disse-lhe eu com toda a calma. Só lamento que o caro leitor não possa ouvir a
colocação da minha voz...
A colega T.B., que por
natureza tem muitos nervos, com o medo, ficou ainda mais nervosa e balbuciava:
- É que a prof. Antónia
Mancha…
- É bruxa! – rematei eu,
perante o olhar baralhado da colega T.B – Não sou?!? – acrescentei, já com a
nuvenzinha da dúvida existencial a pairar.
- Não, não é isso,
podemos contar-lhe a verdade, certo, Antónia? – perguntava-me.
- Certo, certo –
disse-lhe, também eu curiosa por saber essa verdade sobre mim.
- É que a Professora
Antónia conhece muito bem o gerente do Continente – dizia a colega T.B à jovem
E., cujos olhos bailavam entre ela e o meu rosto sério.
- Pois sou – disse logo
eu – já a pensar numa maneira eficaz de “limpar o sebo” ao colega P.C., pelos
boatos que levanta.
Ora ao entrar na sala de
professores, encontrei justamente o referido colega, cresci para ele de uma
maneira, que até notei que alguns dos presentes, vendo que estava de cabeça
perdida, se me acercaram para me deter.
- Olha, ainda não saiu o
casamento e quero o divórcio já!! – vociferei, enquanto lhe gritava na cara
(com elegância, claro está) a jura que
aluna havia feito, garantindo que não havia estado naquele espaço comercial.
- Ai a mentirosa! – disse
com uma expressão, na qual se notava muita sinceridade. E não sei se por isso,
se pelo amor que é cego, perdoei-lhe e fui para a aula, que embalada pelo bem
estar com que o perdão nos aconchega, me correu muito bem.
Isto dos processos irregulares de formação de palavras tem muito que se lhe diga e este ano não
foi excepção. Lá comecei com a ida ao Shopping, onde comi uma pizza e
tomei um capuccino, tendo depois entrado numa loja e comprado um abat-jour
.
- O que é isto, moços? –
perguntei, muito segura de que saberiam a resposta.
- Gastar dinheiro, pressora
! – respondeu logo a M.C.,preocupada com a minha economia doméstica. Parece ela
que adivinha que anda pelas “ruas da amargura”.
Que sim, dizia eu, que
era verdade, mas lá dei nome à coisa, referindo que eram empréstimos e que até
havia palavras que nós já “aportuguesámos”, caso de dossiê, dizia.
- Esse é uma adopção!! –
disse o P.C.
E eu avancei logo, para não
lhe responder aquilo que me veio à cabeça.
(Momento de
recuo no tempo, vulgo analepse)
Na semana passada contei
aos moços quem era o Pepe. Aqui vo-la apresento, para que possais entender o
comentário do A.T.
(Fim do momento
de recuo no tempo)
Depois, foi a vez das
onomatopeias. Que era uma forma de reproduzir os sons na escrita, dizia eu, e
com receio de que os moços não entendessem, vá de dar exemplos. Vi uns olhitos confusos,
e vá de reforçar os exemplos:
- Reparem, quando eu faço
“toc, toc”, o que é?
- O espanhol sem braços! –
respondeu o A.T., recordando-se da belíssima anedota que lhes contara uns dias
antes e que se encontra no “momento de recuo no tempo”.
Depois disto, e já noutra
turma, vá de pôr os moços a escrever... sentei-me no escritório e dizendo que
cada par poderia vir ter comigo três vezes. Que sim, que tinham entendido.
O tempo foi passando, e o
F.T. pôs o dedo no ar para pedir a palavra, que lhe foi dada e saiu assim:
- Oh pressora,
quantas vidas é que o meu grupo tem?
Confesso que levei um
bocadinho a perceber o que me queria realmente perguntar. Mas assim que me
apercebi, decidi implementar essa terminologia, de forma que, a partir de
agora, dou três vidas aos jovens, quando as gastarem é rezar-se-lhes pela alma.
0 Comentários:
Enviar um comentário