A outra - a crónica necessária




Contrariamente à crónica anterior, esta reveste-se de uma pertinência inegável. É que, ontem, entre perguntas como “Então e a crónica?” e “Passei todo o fim-de-semana no Facebook”, também houve comentários mais sérios, revestidos de uma inegável tristeza que, naturalmente, comoveram este brando coração que trago no peito. Eis o responsável de tamanha comoção:
- Olha lá, Antónia, quando é que entraste no elevador sem que eu te visse?
Pus em funcionamento os incontáveis neurónios que trago comigo, numa tentativa desesperada de perceber exactamente a que é que a colega em causa se referia. Assomou-me logo uma pergunta: seria suposto ela ver-me sempre que entro no elevador? Ou andaria a colega a controlar as vezes que subo e desço, numa tentativa de controlar e baixar a conta da energia que a escola gasta? Já a chegar a um ponto de insustentável indignação, lá consegui alcançar o que me pretendia perguntar:
- Não eras tu! – disse logo eu, com a sensatez e a sensibilidade que tanto me caracterizam. Só depois me apercebi do olhar de desilusão com que me miravam. Numa questão de segundos, tentei “compor o ramalhete” e noutra fracção de segundos, achei melhor não piorar as coisas e disse:
- Agora tenho aula, depois falamos.
Passo a explicar: na penúltima crónica, referia a fúria da colega M.C. que passou por mim sem me ver, tal o estado de desorientação em que ia, para nem sequer reparar na pessoa que sou. Ora o que é que acontece? O que acontece é que as pessoas gostam muito da coscuvilhice e vá de lerem as crónicas, para, de alguma forma, encontrarem sentido para a sua existência. (Permitam-me este parêntesis, o sentido da existência é não ter qualquer sentido. Isto só para vos poupar a buscas infrutíferas.)
Vai daí, uma colega, que também é M.C., mas não a M.C. a quem me referia no textozinho, achou que era dela de quem falava e vá de me pedir explicações. Onde é que eu a tinha visto, sem que ela me tivesse visto e/ ou vice-versa. Foi neste seguimento que veio a tal resposta: “Não eras tu”, que quase fez verter uma lágrima à M.C. a quem não me referira.
Para que fique claro, a colega M.C. aludida é a de M., já a outra, a que teve pena de não ser ela, é de M. Faço-me entender? É que não posso passar das iniciais, por uma questão de protecção da privacidade, coisa que está muito na moda e eu gosto muito da vanguarda. Vai daí, caríssimos leitores, deixo-vos a pensar. Quem é a colega M.C. referida? Quem é a colega M.C. ignorada, mas que ansiava por ser referida?
Importa uma discussão séria em torno da questão. A colega M.C. agradece. E lá está de novo o equívocozinho.  A quem me referirei?
Depois da aula, encontrei-a. A que pensava ter sido referida e que recebeu, como faca afiada no peito, o desengano de que a M.C. não era ela. Era a outra. E disse-me ela. A que não apareceu na crónica:
- Ah, e eu a pensar que era eu…
- Não, “afinal havia outra(1)”, mas vou escrever só para ti. – assegurei.
Como não falto à palavra dada e tenho muitos testes para corrigir, aqui estou a escrever para a M.C., de M., não a M.C., de M.
E assim vão os dias…

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(1(1)  – “Afinal havia outra” –êxito musical de Mónica Sintra, essa incontornável voz da mais erudita música portuguesa.

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